Quem é o pai da língua de sinais?

11 visualizações

O linguista americano William Stokoe é considerado o pioneiro no estudo das línguas de sinais, sendo frequentemente chamado de pai da linguística de sinais. Sua pesquisa abriu caminho para a compreensão dessas línguas como sistemas linguísticos completos e distintos.

Feedback 0 curtidas

William Stokoe: O Pai da Linguística de Sinais? Um Olhar Crítico

A afirmação de que William Stokoe é o “pai da linguística de sinais” é frequentemente repetida, mas requer um olhar mais nuançado. Enquanto seu trabalho foi monumental e revolucionário na forma como as línguas de sinais passaram a ser compreendidas, atribuir-lhe a paternidade de forma exclusiva ignora as ricas histórias e tradições das comunidades surdas que, por séculos, usaram e desenvolveram suas próprias línguas complexas e sofisticadas.

Stokoe, linguista americano, publicou em 1960 sua dissertação seminal, “A Dictionary of American Sign Language on Linguistic Principles,” que marcou um ponto de inflexão no estudo das línguas de sinais. Até então, elas eram frequentemente vistas como sistemas rudimentares de gestos, sem a complexidade e estruturação de línguas faladas. A pesquisa de Stokoe, que utilizou métodos linguísticos rigorosos para analisar a ASL (American Sign Language), demonstrou que a ASL possuía uma gramática própria, fonética, morfologia e sintaxe, tão elaboradas quanto as de qualquer língua oral. Ele desmistificou a visão de que a língua de sinais era apenas uma forma de mímica ou pantomima, estabelecendo-a como um sistema linguístico autônomo e completo.

Sua contribuição foi inegavelmente crucial para o avanço do campo. A demonstração da estrutura linguística da ASL abriu portas para estudos similares em outras línguas de sinais ao redor do mundo, impulsionando a pesquisa e a valorização dessas línguas dentro do campo da linguística. Sua metodologia, que combinava observação detalhada com análise formal, tornou-se um modelo para estudos subsequentes.

No entanto, é crucial reconhecer a complexidade dessa narrativa. Antes de Stokoe, as comunidades surdas já possuíam e utilizavam suas línguas com fluência e complexidade, transmitindo cultura, conhecimento e identidade através delas. A pesquisa de Stokoe, embora fundamental, foi realizada sobre essas línguas, já existentes e dinâmicas, sem, necessariamente, a participação ativa e colaborativa das próprias comunidades surdas na construção do conhecimento. Esse aspecto é crucial para se pensar a questão da “paternidade”.

Atribuir a Stokoe a “paternidade” pode, de forma inconsciente, perpetuar um discurso que minimiza a autoria das comunidades surdas na criação e evolução de suas línguas. Ele foi um pioneiro na linguística de sinais, mas as línguas de sinais em si sempre foram, e continuam sendo, criadas e nutridas pelas comunidades surdas ao longo de gerações.

Portanto, em vez de focar em um único “pai”, é mais apropriado reconhecer Stokoe como um figura crucial na descoberta científica e na legitimação acadêmica das línguas de sinais, enquanto simultaneamente reconhecemos as comunidades surdas como os verdadeiros criadores e mantenedoras dessas ricas e complexas heranças linguísticas. A história das línguas de sinais é uma história de comunidades, de resistência e de criação linguística, e não pode ser resumida a um único nome.