Onde se fala o português correto?

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A norma culta portuguesa, frequentemente considerada a referência, é associada principalmente às classes cultas de Lisboa e Coimbra, e à região que as interliga. Esta percepção, porém, é uma convenção social e não reflete uma única norma gramatical inquestionável. Outras variantes do português também possuem legitimidade e riqueza linguística.

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A Busca Pela “Voz Certa”: Onde Reside o Português Correto?

A eterna questão da “língua portuguesa correta” paira sobre nossas cabeças, ecoando nos corredores da escola, nas conversas informais e até nos debates acadêmicos. A resposta, contudo, é mais complexa do que um simples “sim” ou “não”. A ideia de que existe um único lugar onde o português impecável floresce, uma espécie de Meca da gramática, é uma simplificação perigosa que ignora a vibrante diversidade da língua.

Tradicionalmente, a norma culta portuguesa, aquela que encontramos nos livros didáticos e nas gramáticas, é associada às classes mais instruídas de Lisboa e Coimbra, na região central de Portugal. Existe uma ideia, reforçada pela história e pela influência cultural, de que ali reside a “verdadeira” forma de falar e escrever em português. No entanto, essa percepção é mais uma convenção social do que uma verdade absoluta.

Reduzir a complexidade do idioma a uma única variante geográfica ou social é limitar sua riqueza e vitalidade. A língua é um organismo vivo, em constante transformação, influenciada pela cultura, pela história e pelo contexto social de seus falantes.

A Ilusão da “Pureza” Linguística:

A noção de uma língua “pura” e imutável é, em grande medida, uma ilusão. O português, assim como qualquer outra língua, evoluiu ao longo dos séculos, incorporando influências de outros idiomas, dialetos e gírias. A busca por uma forma “correta” que ignore essa evolução é como tentar aprisionar um rio em uma garrafa.

Brasil e Portugal: Dois Rios que Desaguam no Mesmo Mar:

No caso do português, a distância geográfica e a história distinta do Brasil e de Portugal levaram a desenvolvimentos linguísticos únicos em cada país. O português brasileiro, com sua sonoridade característica e suas particularidades gramaticais, não é uma “corrupção” da língua portuguesa. É simplesmente uma variante legítima, moldada por sua própria trajetória.

A Legitimidade da Diversidade:

Em vez de procurar um único ponto de referência para o “português correto”, é fundamental reconhecer a legitimidade e a riqueza das diversas variantes da língua. A norma culta, sem dúvida, desempenha um papel importante na comunicação formal e acadêmica, servindo como um padrão de referência para a escrita e a leitura. No entanto, outras variantes, como o português falado nas diversas regiões do Brasil, em Angola, Moçambique ou Timor-Leste, possuem sua própria gramática, seu próprio vocabulário e sua própria beleza.

O Contexto é o Rei:

Em última análise, o que define o “português correto” é o contexto em que ele é utilizado. Em uma reunião de negócios, a norma culta pode ser a mais apropriada. Em uma conversa informal com amigos, a liberdade linguística pode reinar. A chave é a adequação.

Conclusão:

A busca pelo “português correto” não deve ser uma busca por uma utopia linguística, mas sim um exercício de apreciação da diversidade e da riqueza da língua. O português não tem um único lar, mas sim múltiplos lares, cada um com sua própria voz, seu próprio sotaque e sua própria história. A beleza da língua reside justamente nessa multiplicidade, nessa capacidade de se adaptar e de se reinventar constantemente. Em vez de nos preocuparmos em encontrar a “voz certa”, devemos celebrar a polifonia do português e nos esforçarmos para compreender e apreciar todas as suas nuances.